Um novo caminho para fraudar as eleições informatizadas brasileiras foi apresentado ontem (10/12) para as mais de 100 pessoas que lotaram durante três horas e meia o auditório da Sociedade de Engenheiros e Arquitetos do Rio de Janeiro (SEAERJ), na Rua do Russel n° 1, no decorrer do seminário “A urna eletrônica é confiável?”, promovido pelos institutos de estudos políticos das seções fluminense do Partido da República (PR), o Instituto Republicano; e do Partido Democrático Trabalhista (PDT), a Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini.
Acompanhado por um
especialista em transmissão de dados, Reinaldo Mendonça, e de um delegado de
polícia, Alexandre Neto, um jovem hacker de 19 anos, identificado apenas como
Rangel por questões de segurança, mostrou como — através de acesso ilegal e
privilegiado à intranet da Justiça Eleitoral no Rio de Janeiro, sob a
responsabilidade técnica da empresa Oi – interceptou os dados alimentadores do
sistema de totalização e, após o retardo do envio desses dados aos computadores
da Justiça Eleitoral, modificou resultados beneficiando candidatos em
detrimento de outros – sem nada ser oficialmente detectado.
“A gente entra na rede da
Justiça Eleitoral quando os resultados estão sendo transmitidos para a
totalização e depois que 50% dos dados já foram transmitidos, atuamos.
Modificamos resultados mesmo quando a
totalização está prestes a ser fechada”, explicou Rangel, ao detalhar em linhas
gerais como atuava para fraudar resultados.
O depoimento do hacker –
disposto a colaborar com as autoridades –
foi chocante até para os palestrantes convidados para o seminário, como
a Dra. Maria Aparecida Cortiz, advogada que há dez anos representa o PDT no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para assuntos relacionados à urna eletrônica;
o professor da Ciência da Computação da Universidade de Brasília, Pedro Antônio
Dourado de Rezende, que estuda as fragilidades do voto eletrônico no Brasil,
também há mais de dez anos; e o jornalista Osvaldo Maneschy, coordenador e
organizador do livro Burla Eletrônica, escrito em 2002 ao término do primeiro
seminário independente sobre o sistema eletrônico de votação em uso no país
desde 1996.
Rangel, que está vivendo sob
proteção policial e já prestou depoimento na Polícia Federal, declarou aos
presentes que não atuava sozinho: fazia parte de pequeno grupo que – através de
acessos privilegiados à rede de dados da Oi – alterava votações antes que elas
fossem oficialmente computadas pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
A fraude, acrescentou, era
feita em benefício de políticos com base eleitoral na Região dos Lagos – sendo
um dos beneficiários diretos dela, ele o citou explicitamente, o atual
presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o
deputado Paulo Melo (PMDB). A deputada Clarissa Garotinho, que também fazia parte da mesa, depois de dirigir
algumas perguntas a Rangel - afirmou que
se informará mais sobre o assunto e não pretende deixar a denúncia de Rangel
cair no vazio.
Fernando Peregrino,
coordenador do seminário, por sua vez, cobrou providências:
“Um crime grave foi cometido
nas eleições municipais deste ano, Rangel o está denunciando com todas as
letras – mas infelizmente até agora a
Polícia Federal não tem dado a este caso a importância que ele merece porque ele atinge a essência da própria democracia
no Brasil, o voto dos brasileiros” – argumentou Peregrino.
Por ordem de apresentação,
falaram no seminário o presidente da FLB-AP, que fez um histórico do voto no
Brasil desde a República Velha até os dias de hoje, passando pela tentativa de
fraudar a eleição de Brizola no Rio de Janeiro em 1982 e a informatização total
do processo, a partir do recadastramento eleitoral de 1986.
A Dra. Maria Aparecida
Cortiz, por sua vez, relatou as dificuldades para fiscalizar o processo
eleitoral por conta das barreiras criadas pela própria Justiça Eleitoral;
citando, em seguida, casos concretos de fraudes ocorridas em diversas partes do
país – todos abafados pela Justiça Eleitoral. Detalhou fatos ocorridos em
Londrina (PR), em Guadalupe (PI), na Bahia e no Maranhão, entre outros.
Já o professor Pedro
Rezende, especialista em Ciência da Computação, professor de criptografia da
Universidade de Brasília (UnB), mostrou o trabalho permanente do TSE em
“blindar” as urnas em uso no país, que na opinião deles são 100% seguras. Para
Rezende, porém, elas são “ultrapassadas e inseguras”. Ele as comparou com
sistemas de outros países, mais confiáveis,
especialmente as urnas eletrônicas de terceira geração usadas em algumas
províncias argentinas, que além de imprimirem o voto, ainda registram
digitalmente o mesmo voto em um chip embutido na cédula, criando uma dupla
segurança.
Encerrando a parte acadêmica
do seminário, falou o professor Luiz Felipe, da Coppe da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, que em 1992, no segundo Governo Brizola, implantou a
Internet no Rio de Janeiro junto com o próprio Fernando Peregrino, que, na
época, presidia a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj).
Luis Felipe reforçou a idéia de que é necessário aperfeiçoar o sistema
eleitoral brasileiro – hoje inseguro, na sua opinião.
O relato de Rangel –
precedido pela exposição do especialista em redes de dados, Reinaldo, que
mostrou como ocorre a fraude dentro da intranet, que a Justiça Eleitoral
garante ser segura e inexpugnável – foi o ponto alto do seminário.
Peregrino informou que o
seminário será transformado em livro e
tema de um documentário que com certeza dará origem a outros encontros sobre o
mesmo assunto – ano que vem. Disse ainda estar disposto a levar a denuncia de
Rangel as últimas conseqüências e já se considerava um militante pela
transparência das eleições brasileiras: “Estamos aqui comprometidos com a
trasnparência do sistema eletrônico de votação e com a democracia no Brasil”,
concluiu. (OM)
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